sábado, 23 de maio de 2009

Camundogs encerra seqüência de shows acústicos com casa cheia e aplaudidos de pé


Por Jackie Pinheiro
É certo que o alimento do artista é o reconhecimento de público e de crítica, mas nesse item o Acre ainda está mal servido. Temos excelentes artistas, mas não temos resenhistas. Já que este é o quadro atual, vou ousar, com a cara e a coragem e na intenção de contribuir com a cena cultural acreana, tecendo alguns comentários acerca do show, munida apenas de uma forte sensibilidade para a arte e a vontade de dizer o que ainda não foi dito. Quisera eu entender de música para poder produzir uma resenha à altura do talento e da maturidade musical do grupo Camundogs, que finalizou sua ruidosa participação na sexta edição do projeto “Acústico em Som Maior” realizado pela Fundação Elias Mansour, na terça-feira, 19, no Theatro Hélio Melo, com casa cheia.

Se há uma palavra que possa definir o show da banda na temporada Acústico em Som Maior, certamente ela é “profissionalismo”. Com 11 anos de estrada e contando com músicos do quilate de Aarão Prado (voz), Marxson Henrique (teclado e piano), Raimundo Neto (bateria), João Paulo (baixo), Chico Mouse (violoncelo) e do guitarrista Gilberto Lucas, muito à vontade (embora a contragosto) no violão, a banda fez uma apresentação carregada de carisma e competência. Abro aspas para o contragosto do guitarrista: “Calvário para o guitarrista? Nem tanto. As impacientes pernas do roqueiro em parte delatavam sua vontade de estar fazendo os costumeiros solos na guitarra, mas também demonstravam sua empolgação com o resultado do trabalho”.

Para completar o time, o produtor musical da banda, André Dantas (teclados), renomado músico acreano, somou e ampliou ainda mais o alto nível sonoro do espetáculo, composto por músicas do EP “In...dependente”, lançado oficialmente naquela noite com músicas autorais, e do DVD "Acústico & Plugado", gravado em 2007.

A primeira impressão é a que fica
Abertas as cortinas, a impressão que tive foi a de que estava na gravação de um daqueles shows acústicos gravados pela MTV que a gente vê na televisão. A atmosfera do palco era sóbria, com luz precisa, cenário eficiente, sete músicos (Sete? Yes, seven! Uma coisa meio Titãs) sentados usando roupas escuras, cada um com seus instrumentos. À exceção de Aarão, munido apenas pela voz, que talvez seja o maior instrumento da banda. Definitivamente, ele é dono de um timbre de voz incomum e que agrada os ouvidos mais exigentes. Mas vamos ao show... Aarão abriu o set com a música Em Paz, seguida por Delicadas Formas de Ironia.

Poltrona especial para convidado Heloy de Castro, um dos ídolos da banda

Na seqüência, a participação de Heloy de Castro na música O Termo, citado como referência da banda, teve direito a dueto com o vocalista Aarão Prado e poltrona especial para o convidado. Muito aplaudido, Heloy – que é o próximo a se apresentar no projeto Acústico em Som Maior - deixou o palco juntamente com os músicos Marxson, Raimundo Neto e João Paulo, para um momento tão intimista quanto aguardado: a apresentação da nova música da banda, chamada “¼”.

Isso mesmo! O nome da música é um número fracionado! A melancolia que permeia a nova música é um dos mais belos momentos do show. Letra e melodia são extremamente coerentes onde a instrumentação mostra-se competente e de agradável sonoridade proporcionada pelos belos solos do cellista Chico Mouse e do pianista André Dantas, com uma generosa amostra do talento e da extensão vocal de Aarão.

Hora de voltar à formação inicial. Com todos os músicos no palco, o show segue com uma brilhante adaptação de Diga lá, Rapaz!, no melhor estilo rockabilly, sugerida por André Dantas durante os ensaios e aprovada pela banda. Cá embaixo, os Camundogs faziam a música de Tião Natureza, enquanto o autor do sucesso da década de 80 abençoava lá de cima. Com certeza aprovava o que via e ouvia!

O show com 11 músicas e pouco mais de uma hora de duração prosseguiu com a canção Um Som, seguida de Contraponto, composta pelo líder da banda em homenagem a sua mãe, que compareceu pela primeira vez a um show da banda na segunda apresentação do projeto. A música seguinte foi Something. Ora, não poderia faltar “aquele momento” Beatles! Afinal, todo roqueiro que se preze teve influência dos rapazes de Liverpool. E para isso os roqueiros da Camundogs optaram por apresentar a música com os arranjos originais já conhecidos do público.

André Lima, o vocalista da banda Capuccino Jack. Voz marcante e grande presença de palco

Se no início do show, a banda se valeu da experiência do veterano Heloy de Castro, no final contou com a densa e visceral performance do “baby face” do rock acreano André Lima, em Depois da Tarde. Com voz marcante e grande presença de palco, o vocalista da Capuccino Jack dá provas que a nova geração do rock não está pra brincadeira. Ao final agradeceu o convite de dividir o palco com os músicos e arriscou algumas palavras a mais, porém a emoção não permitiu que as mesmas aparecessem numa seqüência lógica. Resolveu, então, definir o show com uma palavrinha impublicável, obviamente arrancando gargalhadas da platéia. “Galera, o showt tá f....”, resumiu.

Ufa! Hora de relaxar um pouco... Foi realmente uma “viagem” ouvir Aarão Prado cantando a música Viagem, da banda Mapinguari Blues, muito bem acompanhado pela entusiasmada platéia, que cantou em coro todos os versos. É a programação da Rádio Aldeia rendendo bons frutos!

Hora de fechar as cortinas! Que pena...

Fim do show com muitos aplausos e pedidos de bis

E tendo como ressonância um coletivo “ahhhh!” do público presente, foi que Aarão anunciou o fim da temporada acústica com a derradeira música do espetáculo - Sessão da Tarde, embora os ponteiros do relógio já passassem das 21h. Ao final, durante os extensos agradecimentos a todos que ajudaram no projeto, um momento de descontração. O baixista João Paulo pediu a palavra e disse que tinha um recado final. Tentando imitar voz de criança disse que “queria mandar um beijo pra minha mãe, pro meu pai e pra você”, arrancando gargalhadas e aplausos da platéia. E foi com esse espírito alegre que as cortinas se fecharam.

Eu diria que a Camundogs surpreendeu o público presente. Não houve falhas que pudessem ser percebidas - além da emoção sentida em alguns momentos na estremecida voz de Aarão -, mas isso era apenas um detalhe frente à genialidade do espetáculo. Enfim! A banda estava muito à vontade no palco e fez um excelente trabalho, mostrando sintonia entre os integrantes, arranjos criativos e boa postura de palco, que seduziram o público. Com músicos deste naipe, não tinha como ser diferente, não é mesmo? Foi um show irrepreensível que mostra a nova fase, mais profissional e cada vez mais sólida, em que se encontra a música “in... dependente” acreana. Valeu muito ter assistido e com certeza o público ficará no aguardo de novo show. Que venham os próximos!

Além disso, muita gente comentou positivamente a respeito da qualidade do som e da luz, achando que fossem técnicos de fora, mas não! Eram acreanos mandando muito bem. As luzes, feitas por Mayk Vasconcelos e Saulinho Machado estavam perfeitas, nas cores, no tempo e na intensidade, e eram complementadas pelo som cristalino assinado por Beto Dantas, permitindo à platéia sentir o espetáculo por inteiro, em cada nota tocada e cantada pelos músicos.

Devo e quero destacar ainda o trabalho impecável de guerreiros como o diretor geral do espetáculo Alexandre Nunes, o diretor musical André Dantas e o produtor Tácio Júnior. A música local também não sobreviveria sem a persistência quase poética desses caras. A produtora Esfera Produções, velha parceira da banda, também estava presente registrando o show para, futuramente, transformá-lo em DVD. Enfim, a carreira da banda está de vento em popa e novos projetos virão. Agora é esperar o próximo convite! Enquanto isso o público pode ir curtindo as músicas do EP “In... dependente” e do DVD gravado em 2007. A Camundogs agradece.

Espero que esta despretensiosa resenha instigue o surgimento de resenhistas e críticos de música no Acre para acompanhar e contribuir com o trabalho crescente dos artistas da terra.

As fotos são de Talita Oliveira
+ no endereço www.flickr.com/talitaoliveira
Agradecimentos: Tiago Juruá

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